segunda-feira, 1 de junho de 2009

Saudades do Zé

Saudade do Zé

De fato, o homem jamais vai aceitar a perda pela morte. E é bom que seja assim. É por isso que nos preservamos e protegemos aos que amamos mais que a nós mesmos. E quanto menos temos o poder de evitar o inevitável, mais nos sentimos traídos pelo que deveria simplesmente ser natural.

Dia 22 de maio perdi um amigo, e nenhuma outra designação cabe melhor que essa: amigo. Zé Rodrix entrou em nossas vidas pelas mãos da Tetê, minha filha, quando ela fez contato com o Clube Caiubi em São Paulo, para promover um encontro de compositores aqui no interior do Estado. Em princípio, achei que, mais que um sonho, conhecer o Zé não faria parte da vida de uma fãzinha tão desimportante como eu. Isso era coisa pra Tetê que já nascera artista. Ainda assim, atrevi-me a mandar a ele um livrinho meu, porque soube que ele gostava muito de ler.

Daí pra frente, um universo que eu não fazia idéia começou a ser desenhado com nossos encontros em família, nossas conversas, nossas risadas. Veio com a Júlia e a Bárbara ao meu humilde bangalô para comermos juntos, sentarmo-nos no chão pra olhar discos, livros, bem do jeito que achei que era, antes de sabê-lo melhor. Autografou-me um livro dele, falamos do Taiguara, da Elis, do Clube Caiubi e de todas aquelas figuras fantásticas com quem trabalhava: Sá, Guarabira, Tavito e tantos outros. Descobri até que eu tinha um vinil da Rosa Maria produzido por ele.

Ele acompanhou o primeiro trabalho sério de gravação do Hai Kai, encantou-se com os meninos tocando, compondo... Enfim, fez um lindo depoimento a respeito da banda no dia do lançamento do cd. Veio de SP especialmente para participar desse lançamento, e sua generosidade foi tamanha com quem ainda engatinha na pauta de que ele é dono, que passamos a considerá-lo padrinho musical do Hai Kai. E assim é. E assim vai ser sempre, porque não há como esquecer o que ele é, o que ele diz, o que ele doa de si mesmo.

Eu não sabia que doía tanto..., mas como acredito que a alma humana não se acabe com a morte, sei que estaremos juntos, numa casa de campo, no planeta que for melhor pra nós. O Zé já tinha desistido de adivinhar o que aconteceria depois, ele achava melhor esperar para ver quem é que tinha a razão. Talvez tivesse a convicção de que viveria por mais 30 anos e que, com a descoberta humana de todo o processo vital, não morreria mais. Ele não viveu os 30 anos pra ver, mas viverá muito mais por tudo que escreveu, cantou e falou, por tudo o que nos deu de afeto, sem qualquer expectativa de ser retribuído. Amava pelo prazer de sentir, cantava pelo prazer de espalhar sentimento, chorava pelo prazer de se entregar à melhor emoção da arte de verdade.

Que saudade doída, Zé... E ainda hoje te ouvi no rádio... com tanta vida! Eu sei que essa vida te acompanha, mas nós, tão pequenos e egoístas, ainda queríamos que você ficasse mais. Desculpa-me não entender ainda o que é que te espera do outro lado. A gente não te queria para o cosmos, mas só para nós mesmos. A gente tem noção de que por lá há coisa maior que o nosso desejo, mas não temos ainda a grandeza do desapego porque a ferida ainda está aberta. Quando fechar, vamos ver tudo bem melhor e, quem sabe, apreciaremos a tudo com o distanciamento suficiente para enxergarmos a tua vida mais nítida, maior e mais bonita ainda.

Por ora, fica bem e recebe esta homenagem que te prestamos.

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